quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Tortura


Era noite, calada, escura e quente.
Ela dormia emaranhada entre os lençóis, num jogo de pernas e coxas à mostra, sonhando com proibições carnais e murmurando palavras desconexas.
Sem nexo, querendo sexo, desejando algo que valesse a noite.

No sonho, ele chega, dono de si e dela totalmente, o corpo rijo sombreado pela luz fraca que adentra as janelas do quarto pequeno, e em direção à cama, salta como um felino que vai em busca da presa.
Inicia caminhos com a boca, subindo e arrematando com a língua, molhando o úmido e aquecendo o quente.
Termina com as mãos o que os lábios começaram.
Em um arrebatamento de dedos, lambidas e mordidas, faz gemer, contorcer, arquear.
Ela abre as pernas involuntariamente, pulsando tesão e implora.
Ele hesita, tortura mais ainda.
Desce a boca em direção ao âmago da feminilidade, e lambe, devora, penetra, suga, e as mãos apertam as coxas grossas.
Sem mais esperar, ela geme, grita, o puxa pelos cabelos, e assume o comando.
Segue a mesma linha de agonia, a tensão pelo que está por vir, é gulosa, ansiosa.
Cavalga, dobra as costas, arranha.

Quem domina? Quem é submisso?
Ali não importava mais.







Goza.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Mea culpa


Anos atrás havia se mudado.
Uma casa maior, muito mais espaço, e esperava: mais conforto.
Uma cor nova, mais quente, e esperava: não ver mais apenas o preto e o branco.
Amizades novas, freqüentar lugares que nem sequer gostava.
Mas esperava e esperava.

Mais vida.
Mais amor.
Menos solidão.
Menos tristeza.
E a própria espera.

A única coisa jamais se livraria: da depressão. De si mesma.
Do inferno que vivia em sua cabeça.

Dos fantasmas que vieram no caminhão de mudanças, acorrentados lado à lado.
Sugando sua alma e deixando buracos profundos, desprovidos de energia e jovialidade que antes estavam presentes ali, e agora jaziam em névoa e escuridão.
Tentava constantemente, todos os dias, ver alguma luz.
Deixava a nova casa sempre acesa; da luz do sol, da lua e jamais se permitia dormir com as luzes todas apagadas. Para o caso de sonhar, saber como voltar depois.

Cultivava flores no jardim, assim como cultivava também olheiras profundas e a palidez do rosto.

Queria gritar com todos, dizer palavrões sinceros, mas a voz era presa, abafada pelo sorriso falso que tatuou na face.

Nada dizia, não reagia mais.
Eles a puxavam pelas pernas, braços, lhe arrancavam os cabelos.

E a casa ficou apertada, pequena.
Passar pela porta machucava.

E finalmente percebeu:

Não havia se mudado, e jamais o faria.

Pode alguém, se mudar de dentro de si?

E em quem colocaria a culpa?






Nela, e apenas nela.

Não diziam sempre que a culpa é sempre nossa? Apenas escolhemos outras pessoas para carregar toda a glória.