quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Mea culpa


Anos atrás havia se mudado.
Uma casa maior, muito mais espaço, e esperava: mais conforto.
Uma cor nova, mais quente, e esperava: não ver mais apenas o preto e o branco.
Amizades novas, freqüentar lugares que nem sequer gostava.
Mas esperava e esperava.

Mais vida.
Mais amor.
Menos solidão.
Menos tristeza.
E a própria espera.

A única coisa jamais se livraria: da depressão. De si mesma.
Do inferno que vivia em sua cabeça.

Dos fantasmas que vieram no caminhão de mudanças, acorrentados lado à lado.
Sugando sua alma e deixando buracos profundos, desprovidos de energia e jovialidade que antes estavam presentes ali, e agora jaziam em névoa e escuridão.
Tentava constantemente, todos os dias, ver alguma luz.
Deixava a nova casa sempre acesa; da luz do sol, da lua e jamais se permitia dormir com as luzes todas apagadas. Para o caso de sonhar, saber como voltar depois.

Cultivava flores no jardim, assim como cultivava também olheiras profundas e a palidez do rosto.

Queria gritar com todos, dizer palavrões sinceros, mas a voz era presa, abafada pelo sorriso falso que tatuou na face.

Nada dizia, não reagia mais.
Eles a puxavam pelas pernas, braços, lhe arrancavam os cabelos.

E a casa ficou apertada, pequena.
Passar pela porta machucava.

E finalmente percebeu:

Não havia se mudado, e jamais o faria.

Pode alguém, se mudar de dentro de si?

E em quem colocaria a culpa?






Nela, e apenas nela.

Não diziam sempre que a culpa é sempre nossa? Apenas escolhemos outras pessoas para carregar toda a glória.

2 comentários:

Manuka disse...

Muito bom esse texto.
Claro que cada pessoa interpreta de uma maneira, mas gostei da parte dos fantasmas, mudam-se as cores, mas os sentimentos são os mesmo. Prisioneira da própria contradição, carcereiro da própria felicidade.
Não está nada enferrujada!
Parabéns e continue postando, beijos.

Guga disse...

Uau... Muito bom. Achei bem particular a maneira que vc escreve, mas de certa maneira me lembrou da morbidez de algumas escritas da manu.

Aliás, essa escuridão do teu template, acrescentou à esse texto.

Gostei, apesar do peso e da negatividade...