quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Sons


“Gosto quando te calas porque estás como ausente, e me ouves de longe, minha voz não te toca. Parece que os olhos tivessem de ti voado e parece que um beijo te fechara a boca.”

Gosto muito desse poema de Pablo Neruda. Singelo e bonito.
E o titulo é perfeito, “Gosto Quando Te Calas” (ou para os entendidos no idioma: “Me Gusta Cuando Callas”) já que fala de algo que gosto muito: os sons.

De todos os tipos, que todas as pessoas fazem, em todo lugar e a qualquer momento.
A forma como os sons nos transmite as emoções, os momentos...
Se fecharmos os olhos, na total ausência da visão, e aguçarmos o sentido da audição, perceberemos como é interessante o som de tudo ao nosso redor. Como ele define a forma com a qual sua vida vem sendo levada. Sons de teclado batendo, impressoras, telefone tocando sem parar, pessoas falando...o som da vida de 90% das pessoas, presas em escritórios, reféns do capitalismo e escravos da rotina.

Um bebê que chora quando tem fome, uma torneira pingando sem parar, o som da água quente de uma ducha, os carros passando, buzinas, microondas avisando que o miojo ficou pronto, café sendo coado, um galo cantando ao longe, um copo quebrado, um pigarro para disfarçar, um salto alto ecoando no piso da sala, a TV anunciando horário político, o celular recebendo um SMS, alguém que bate na porta, um beijo estalado, talheres raspando no prato, chuva no final da tarde, onda do mar na tempestade, raios e trovões, uma guitarra desafinada, grilo na noite, cigarra cantante, o miado do gato preto, pés descalços correndo, uma janela sendo aberta, lixa passando na unha, pipoca na panela, CD arranhado, caneta riscando o papel, lápis-de-cor colorindo um desenho, corpo cansado caindo na cama, gemido de prazer, língua enroscada, sussurro ao pé do ouvido, cama rangendo, um cigarro sendo aceso e um suspiro de satisfação.

E de repente, tudo cessa, e surge o som mais significativo de todos. Aquele que diz tudo sem emitir palavra alguma: o silêncio.

O que mais responde uma pergunta, o que mais acalma um ataque de nervos, o que mais machuca, e o único que te cala em toda a sua força de expressão, o vazio, o nada, o eco do silêncio.

O silêncio e o tempo são faces do mesmo espelho: é somente na presença deles que se pode curar uma ferida, e é também na ausência deles que toda dor é intensificada.

Feche os olhos e preste atenção, que som sua vida faz?





“Gosto de ti quando calas e estás como distante. E estás como que te queixando, borboleta em arrulho. E me ouves de longe, e a minha voz não te alcança: deixa-me que me cale com o silêncio teu.”

Um comentário:

Fabio Hüls disse...

Decifrar um silêncio... Sentir um silêncio...

Aquele que diz tudo que sentimos de verdade. Com uma dança muda.