segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Alice

Choveu naquela noite, mas estava quente e abafado. O que dificultava a respiração e facilitava a pouca roupa. Justificava por que gostava de estar nua deitada na cama, coberta pelo fino lençol, já que algumas restrições sobre seu corpo ainda possuía.
Busca por um cigarro, e o breu do quarto é interrompido apenas pela brasa sendo acesa e a fumaça subindo em formas disformes e desaparecendo ante seus olhos: borrados de rímel e lágrimas. O rastro do cheiro mentolado já ficava um pouco enjoado, mas ainda assim, tragar, sorver, era um bálsamo. De câncer e nicotina. De saudade e raiva. De dor de cabeça e tontura, de incredulidade e afeto, e principalmente de sua obsessão pelo controle da mente e do corpo alheio.

Não do seu corpo, da sua mente.
Dos outros. Seus brinquedos.
Afinal, se preocupar consigo mesmo, não é um hábito praticado. Seria desejável, mas absolutamente: indispensável.
Que graça teria se tripudiasse em cima de suas emoções e deixasse livre os outros à seu redor?
Garotas querem apenas diversão.

Ao longe ela escuta uma voz bonita, explicando sobre algo que deveria ser importante e levado em consideração, mas como criança mimada, seus ouvidos eram treinados para ouvir apenas aquilo que a agrada, mesmo que isso nem sempre seja verdade, apenas mentiras mais interessantes ao mundo dela. Dela dela dela e somente dela.
Egoísta, fica distante e já nem vê mais que a noite e a companhia foram ótimas. Apenas percebe, que nada do que planeja é como deveria ser. Nada está no lugar onde designou que estivesse. Nem ninguém. A palma de sua mão está vazia, e não completamente ocupada pelo desejo que aquele outro corpo no quarto retém. Seus carinhos não o alcançam, seus sorrisos que já havia conquistado tantos corações, como reis conquistaram reinos, não surtiam efeito e sua mente sempre atenta não pensava com clareza. Não sabia o que dizer. A língua já treinada há muito para ferir como navalha soltava frases desconexas e infantis.

Fazia biquinho, desviava o rosto, se irritava e queria gritar, bater, chorar de ódio.
Por quê era diferente? Por quê seu controle não atingia? Perdera o jeito? O charme? A beleza? Seu sexo não era mais convidativo?


Não entendia o que poderia ter dado errado, em que momento deixou de dar as cartas desse jogo. Jogo? Fora realmente um jogo em algum momento?

E como sairia disso?
Não mais ganharia? Iria perder pela primeira vez após tanto tempo invicta?

- Por que você sempre precisa controlar?
- Não sei mais agir de outra forma, sem o controle, o que sobra?
- Diversão talvez? Apenas sentir e ver no que dá?
- Apenas sentir? Ver no que dá? Sentir que estou perdendo terreno e vendo que vou mais uma vez, me doar ao caos?



E assim como veio, vai embora repentinamente, como se o próprio anticristo a perseguisse.








- E as borboletas esmagadas ressuscitam para assombrá-la, querendo vingança.
Prepare o jardim Alice, elas estão voando até você e já lhe esmagam como você fez com elas.
- disse o coelho.










Karma.

2 comentários:

Manuka disse...

Ah Alice!
Quantas histórias tem Alice.
Belo texto, como sempre.
Bjs

Guga disse...

TUDO é jogo.


Alice sempre presente. Fato.